Fumantes de ocasião

por | jun 30, 2016 | Alimentação

Sexta-feira é dia de chope. Nada mais justo, afinal, para quem passou a semana inteira ralando oito horas por dia e precisa terminar a semana – ou começar o final dela – relaxando. Segundo, terceiro copo e, de repente, alguém acende um cigarro. Aquele gesto que, em qualquer outra ocasião, passaria despercebido e, muitas vezes, até despertaria alguma repulsa pelo cheiro ou a fumaça, brilha nos olhos. Nunca um cigarro pareceu tão atraente. E, pronto: basta a primeira tragada para começar uma escalada pela nicotina que só vai acabar na hora de ir pra casa. Porque, no dia seguinte, tudo vai correr naturalmente: nenhum cigarro na boca. Essa é a vida do fumante de ocasião, aquele que nunca tem um maço na bolsa mas que, mesmo sem tragar grandes quantidades, corre tantos ricos quanto o dono do cigarro que ele costumar filar.

A vendedora Carla Amorim trabalha numa loja de perfumes, num shopping. Confessa que, durante o expediente, sente-se incomodada com o cheiro que vem da escada de serviço, que seus colegas adotaram como “fumódromo”. Entretanto, ela assume que bastam alguns chopinhos e o clima de bar para ela se sentir tentada a ceder ao cigarro. “Já fumei meio maço numa noite. Mas só sinto vontade quando eu bebo. Se eu tragar normalmente, me sinto tonta, enjoada”, comenta. O mesmo acontece quando o técnico de informática Júlio Diniz se estressa entre comandos e servidores no trabalho. “Meu colega de sala fuma e quando temos um problema, ele já acende o cigarro. Às vezes, cedo, mas sempre me arrependo”, conta ele, que, no entanto, não dispensa as tragadas pela balada. “Também só fumo quando bebo, fora disso não gosto. Por isso sei que não corro o risco de me viciar, me transformar num fumante”, acredita ele.

A maior parte das doenças causadas pelo fumo não é gerada a partir da quantidade de droga consumida, mas pela continuidade

O pneumologista Ricardo Meireles, da Divisão de Controle de Tabagismo do Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro, afirma que é realmente possível fumar ocasionalmente, sem que o uso do cigarro ocasione necessariamente uma dependência. Mas alerta que isso é um risco. “O vício nasce de uma predisposição genética. Não havendo ela, é possível ter um comportamento ocasional no tabagismo. Isso, no entanto, continua sendo um perigo para a saúde porque ninguém se vicia sem começar a usar”, comenta. Além disso, ele revela que a maior parte das doenças causadas pelo fumo não é gerada a partir da quantidade de droga consumida, mas pela continuidade. “São mais de 4.700 substâncias tóxicas num cigarro. A ingestão delas, mesmo que uma vez por semana, já é extramente perigosa. Uma pequena quantidade é o suficiente para destruir uma célula e, se não for eliminada pelo organismo, a substância pode se tornar cancerosa”, garante.