Ao longo do último mês, comunicados sobre a Covid-19 divulgados pela República Popular Democrática da Coreia, nome oficial da Coreia do Norte, alarmaram o mundo. Segundo as poucas informações liberadas pela principal agência de notícias do país, a pandemia do novo coronavírus teria chegado à tão fechada nação apenas recentemente – e, em meio a falta de informações independentes, recusa de vacinas e vulnerabilidade da população, autoridades em saúde vêm citando grande preocupação com as consequências possivelmente desastrosas desta situação.
Surto de Covid-19 na Coreia do Norte gera apreensão
Por meio da Agência Central de Notícias da Coreia, mais conhecida como KCNA, a Coreia do Norte anunciou recentemente a chegada da Covid-19 ao país, seguida rapidamente por mais de um milhão de casos e ao menos 50 mortes segundo a última atualização.
Devido ao fato de que o país mantém relações praticamente apenas com a China e a Rússia, não é provável a confirmação das informações liberadas pela estatal por autoridades globais de saúde – mas, ainda assim, tanto a OMS (Organização Mundial da Saúde) quanto outros órgãos ligados a direitos humanos já vêm manifestando grande preocupação com a situação.

Com base nas informações liberadas pela nação, que é bastante “fechada” para o mundo de forma geral, o país está vivendo atualmente o que todos os demais países viveram em 2020: uma quantidade enorme de casos da Covid-19 com alta velocidade de transmissão e consequente sobrecarga do sistema de saúde. Conforme informado pela OMS e outros órgãos, porém, há ainda outros fatores que podem fazer desta situação algo devastador não apenas para a Coreia do Norte, mas para todo o mundo.
Recusa de vacinas
Apesar de, segundo a OMS, a Coreia do Norte estar elegível para o programa COVAX Facility e, consequentemente, o recebimento de vacinas para a população, a nação ainda não fez menção de aceitar esta participação. Sobre isso, Poonam Khetrapal Singh, Diretora Regional da OMS no Sudeste Asiático, afirmou em uma nota que a demora do país em iniciar a vacinação representa um grande risco à população. “O vírus pode se espalhar rapidamente pelas massas a menos que isso seja parado com medidas imediatas e apropriadas”, disse ela, frisando que, além de frear a transmissão do vírus, as vacinas reduzem a taxa de casos graves e de mortalidade pela infecção.

Vulnerabilidade histórica da população
Outro aspecto importante a ser avaliado quando o assunto é a gravidade da pandemia na Coreia do Norte é a história do país. Apesar de muito fechados, diversos dados socioeconômicos já foram obtidos ao longo dos anos e eles apontam que, desde sua fundação como República Democrática Popular da Coreia, a nação enfrenta séria escassez de alimentos, e que, fora de Pyongyang, a capital, há pouquíssimo acesso a saneamento básico e outros serviços relacionados a cuidados com a saúde.
Ao veículo “ The New York Times”, Lina Yoon, pesquisadora sênior sobre questões relacionadas à Coreia na organização mundial Human Rights Watch, afirmou que os norte-coreanos são “cronicamente desnutridos e não-vacinados”, algo que torna boa parte da população extremamente vulnerável a desenvolver casos graves da doença e eleva os riscos de haver uma taxa de mortalidade altíssima.

Falta de infraestrutura médica e escassez de medicamentos
De acordo com comunicados liberados pela KCNA, agência de notícias estatal do país, muito estaria sendo mobilizado para garantir a abundância de medicamentos e sua distribuição, mas, ainda segundo Lina Yoon, da Human Rights Watch, a Coreia do Norte enfrenta, atualmente, uma fragilidade muito grande no sistema de saúde. Isso, por sua vez, contribui para que o colapso deste sistema seja ainda mais desastroso do que em países que, apesar de despreparados para uma pandemia, não estavam totalmente defasados por natureza. Atualmente, a Coreia do Norte se encontra em lockdown por decreto do governo.
Ainda segundo Lina Yoon, há outro grande problema que coloca a população da Coreia do Norte em risco. “Restam poucos remédios no país e a infraestrutura de saúde é incapaz de lidar com esta pandemia”, afirmou a pesquisadora da Human Rights Watch sobre a questão.

Diante da situação, a OMS afirmou em nota que se coloca à disposição para garantir suporte técnico, testes e materiais para o combate à pandemia – mas, de acordo com informações transmitidas diversas vezes pelo veículo local “ Rodong Sinmun”, a indústria farmacêutica norte-coreana está focando todos os esforços produtivos na “medicina Koryo”, ou seja, a medicina tradicional coreana, que envolve, por exemplo, certos tipos de chá, banhos, óleos e mais.
Cenário propenso ao surgimento de novas variantes é risco global
De acordo com análises conduzidas na Coreia do Norte e divulgadas pela própria KCNA, foi identificado que a cepa dominante do novo coronavírus lá é, atualmente, a BA.2. Subvariante da ômicron, ela tem se espalhado rapidamente pelo mundo e gerado mais uma onda de casos, mas, até então, a situação demonstrou baixos riscos de elevar demais a taxa de mortalidade. Há, porém, diferenças entre a circulação dela no restante do mundo em comparação com um país que sequer tem vacinas.
Ao ser questionado sobre o tema em uma coletiva de imprensa da OMS. o epidemiologista Michael Ryan, director de emergências de saúde no órgão, afirmou que há muita preocupação relacionada à circulação da Covid-19 de forma descontrolada no país. “Onde há transmissão não controlada, há sempre um maior risco [do surgimento] de novas variantes”, afirmou ele. Apesar do isolamento da nação, isso pode representar risco ao mundo todo.