Em parceria com um médico britânico e a ONG Gemini Untwined, criada por ele, cirurgiões brasileiros conseguiram, recentemente, separar irmãos gêmeos unidos pelo crânio em um quadro raríssimo. O procedimento, que foi custeado tanto pelo Sistema Único de Saúde (SUS) quanto pela ONG, não foi o primeiro do tipo a ser feito no mundo – mas, de acordo com a instituição, o caso de Bernardo e Arthur foi o mais desafiador já enfrentado pelo time.
Gêmeos unidos pelo crânio são separados no Brasil
Com quase quatro anos de idade, os irmãos Bernardo e Arthur, gêmeos craniópagos (unidos pelo crânio) que partilhavam parte do cérebro, passaram por um procedimento extremamente delicado recentemente. Em uma união entre o Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, no Rio de Janeiro, e a ONG britânica Gemini Untwined, especializada em casos do tipo, o par passou por um total de nove cirurgias que, com sucesso, separaram os dois.
Segundo a Gemini Untwined, tudo começou em 2018, quando o casal Adriely e Antônio deixaram a cidade natal em Roraima para buscar a ajuda do Instituto no Rio de Janeiro. Previamente, o procedimento de separação dos gêmeos chegou a ser descartado visto que, além de compartilharem parte do cérebro, os dois também dividiam veias importantes – mas isso não freou a equipe, que envolveu mais de 100 profissionais.
Conforme contou o neurocirurgião Gabriel Mufarrej, um dos médicos que lideraram o procedimento, ao “ Fantástico” (Rede Globo) recentemente, o processo incluiu uma preparação nunca antes utilizada por eles. Durante anos, a estrutura cerebral de Bernardo e Arthur foi analisada por exames de imagem, mas, conforme isso se mostrou insuficiente, os neurologistas envolvidos criaram modelos em 3D para traçar o plano mais adequado.
Eventualmente, o complexo procedimento foi realizado ao longo de diversas cirurgias. Nas primeiras, o foco foi fazer a separação das veias, e os procedimentos foram distribuídos ao longo de meses para que a estrutura cerebral tivesse tempo de se regenerar, “acostumando” com a separação. Já nas duas últimas operações, a equipe envolvida totalizou 33 horas de trabalho – mas tanto a alegria da família ao se deparar com um novo futuro quanto as novas possibilidades que se abriram a outras crianças na mesma situação fizeram o longo processo valer a pena.
Após a parceria de sucesso, o Instituto se tornou um “braço” da ONG no Brasil; de acordo com o médico Noor ul Owase Jeelani, neurocirurgião especializado neste tipo de procedimento e criador da Gemini Untwined, a equipe brasileira está agora perfeitamente capacitada para repetir o feito. Isso, por sua vez, deve assegurar os mesmos cuidados recebidos por Bernardo e Arthur a outros gêmeos craniópagos na América Latina.
Hoje, após o procedimento complexo que os tornou o par de gêmeos craniópagos mais velhos a passar por uma separação, Bernardo e Arthur se recuperam bem e estão sob grande expectativa da equipe médica. Durante os próximos seis meses, os cuidados com os irmãos serão financiados por fundos levantados pela ONG através de doações e, durante este período, a ideia é que os dois passem por reabilitação física.
Ao “Fantástico”, o pai dos garotos, Antônio, se mostrou esperançoso com a nova vida dos filhos. “O maior sonho é ver eles recuperados, com saúde e até com uma vida social como as outras crianças. Poder estudar, jogar bola”, afirmou.